terça-feira, 1 de abril de 2014

trinta mil dias ainda seria pouco tempo

"Fiz ontem as contas e foram mais de trinta mil os dias em que adormecemos e acordámos juntos, na cama onde agora te escrevo e de onde espero sair para ir de novo até ti. Trinta mil dias a olhar-te dormir, a saber o frio ou o calor do teu corpo, a perceber o que te doía por dentro, a amar cada ruga a mais que ia aparecendo. Trinta mil dias de eu e tu, desta casa que um dia dissemos que seria a nossa (que será de uma casa que nos conhece tão bem quando já aqui não estivermos para a ocupar?), das dificuldades e dos anseios, dos nossos meninos a correr pelo corredor, da saudade de nos sabermos sempre a caminho de sermos só nós. Trinta mil dias em que tudo mudou e nada nos mudou, das tuas lágrimas tão bonitas e tão tristes, das poucas vezes em que a vida nos obrigou a separar (e bastava uma tarde longe de ti para nem a casa nem a vida continuarem iguais). Trinta mil dias, minha velha resmungona e adorável. Eu e tu e o mundo, e todos os velhos que um dia conhecemos já se foram com a velhice. Nós ainda aqui estamos, trinta mil dias depois, juntos como sempre. Juntos para sempre. Trinta mil dias em que desaprendi tanta coisa, meu amor. Menos a amar-te."

sexta-feira, 28 de março de 2014

it's you, it's you, it's all for you.

''Sei lá, queria que você soubesse que é você. Quando eu vou atualizar algum amigo dos meus fracassos amorosos e digo "ah, nem liguei, ele era meio vazio. Queria mesmo era... você sabe, né?". E eles sabem, sempre sabem que é você. Queria que você soubesse também. Que quando eu me pego idealizando muito "a pessoa certa" e torço o nariz pra mim, me achando exigente demais, penso que não queria mudar nadica de nada em você e sorrio, com saudade. Queria te dizer o quanto tudo que você disse ficou guardado em mim, marcado fundo, mesmo que eu tivesse ouvido tão calada. Mesmo sem ter respondido à altura. Foi só medo de falar demais e atropelar tudo, como sempre. Você nem imagina, mas é você, eu juro. Queria que soubesse do tanto que eu já escrevi, sobre você e pra você, mas nunca te enviei nem uma frase. Quando eu deixo a imaginação solta e me pego sonhando com programinhas bobos/românticos, vendo a lua de um lugar bonito com alguém, você é esse alguém. Eu acho que esse é o ridículo da vida, nunca saber a dimensão do espaço que a gente ocupa na vida dos outros, porque ninguém conta pra gente. Com medo de a gente fugir. E, ás vezes, a gente só quer (tanto) ficar. Tudo isso porque, em alguma esquina do caminho, a gente aprende, com a dor, que falar o que sente pode não ser a opção mais inteligente. E, a partir de então, a gente acaba meio burro. Empancado, batendo pé e cabeça. Complicando e dificultando o que já não é simples por natureza. Querendo dominar o que sente, o que o outro pensa, o que o destino planejou. Não é de hoje que o homem tem essa mania besta de entender e controlar o mundo. A gente acaba esquecendo que, na vida, o bom mesmo é se entregar. A gente sempre fica de marcar qualquer coisa e nunca marca, então vamos fazer melhor! Vamos fazer uma história e marcar duas vidas. Tô pronta. Passa aqui pra me buscar?''

segunda-feira, 24 de fevereiro de 2014

"Comecei a amar-te no dia em que te abandonei.

Foram as palavras dele quando, dez anos depois, a encontrou por mero acaso no café. Ela sorriu, disse-lhe “olá, amo-te” mas os lábios só disseram “olá, está tudo bem?”. Ficaram horas a conversar, até que ele, nestas coisas era sempre ele a perder a vergonha por mais vergonha que tivesse naquilo que tinha feito (como é que fui deixar-te? como fui tão imbecil ao ponto de não perceber que estava em ti tudo o que queria?), lhe disse com toda a naturalidade do mundo que queria levá-la para a cama. Ela primeiro pensou em esbofeteá-lo e depois amá-lo a tarde toda e a noite toda, de seguida pensou em fugir dali e depois amá-lo a tarde toda e a noite toda, e finalmente resolveu não dizer nada e, lentamente, a esconder as lágrimas por dentro dos olhos, abandonou-o da mesma maneira que ele a abandonara uma década antes. Não era uma vingança nem sequer um castigo – apenas percebeu que estava tão perdida dentro do que sentia que tinha de ir para longe dali para ir para dentro de si. Pensou que provavelmente foi isso o que lhe aconteceu naquele dia longínquo em que a deixara, sozinha e esparramada de dor, no chão, para nunca mais voltar.

De tudo o que amo és tu o que mais me apaixona.

Foram as palavras dela, poucos minutos depois, quando ele, teimoso, a seguiu até ao fundo da rua em hora de ponta. Estavam frente a frente, toda a gente a passar sem perceber que ali se decidia o futuro do mundo. Ele disse: “casei-me com outra para te poder amar em paz”. Ela disse: “casei-me com outro para que houvesse um ruído que te calasse em mim”. Na verdade nem um nem outro disseram nada disso porque nem um nem outro eram poetas. Mas o que as palavras de um (“amo-te como um louco”) e as palavras de outro (“amo-te como uma louca”) disseram foi isso mesmo. A rua parou, então, diante do abraço deles."

sábado, 22 de fevereiro de 2014

letter to the one that broke me.


Olá,

Sei que foi ainda só ontem que abandonamos a vida um do outro, mas não podia deixar que as coisas acabassem assim. Tenho 17 anos, sou uma mulher e duma vez por todas não vou deixar nada por dizer.
Não é que tu mereças nada disto, porque tu não mereces, mas só o facto de não conseguir dormir com tudo o que tenho preso dentro de mim, em cativeiro até à data em que me esquecesse de isto tudo, dir-te-ei tudo o que penso.
Tu não me conheces nem eu te conheço e acredito piamente que há pessoas que entram na nossa vida para nos ensinarem a deixar o passado onde ele pertence. Mas mesmo não me conhecendo eu vou resumir-te como sou... Nunca lidei bem com perdas e nunca me consegui desligar do passado.
Tu não entendes, nunca passaste pelo mesmo, mas um dia entenderás.
Sempre fui difícil de agradar, mas tu conquistaste-me. Tu fazias vibrar cada uma das minhas células. Eras tudo aquilo que eu queria, precisava e desejava. Eras o meu sonho, mas nunca quis acreditar nisso. Davas-me segurança com um só abraço e eu sempre o neguei, tentando antever a queda para que quando isso acontecesse, algo me amortecesse a mesma. Fizeste-me sentir viva, deste cor à minha vida e apareceste na melhor altura. Contudo, eu não confiei em ti, nunca acreditei que tudo o que dizias pudesse ser verdade e os teus atos presentes, só me provam de que o meu instinto estava correto e mesmo tentando dar-te o melhor de mim, mesmo tentando fechar os olhos a todos os meus medos e inseguranças, a tudo o que diziam, mesmo tentando cair um bocadinho de cada vez e ser sempre sincera contigo, não foi suficiente.
Leio e releio os textos de Dezembro, as mensagens de ano novo em que prometeste aturar-me até sermos velhinhos, as mensagens de bom dia, de boa noite, as que diziam só adoro-te ou mesmo aquelas em que dizias querer ficar comigo, querias que um dia acordasse ao teu lado e que eu te fazia feliz.
Sabes quando uma pessoa dá demasiado a outra que já não sabe bem quem é?! Foi o que aconteceu. A vida não é cinza, há que ser sincero, correto, simples e claro. Não quero mais complicações, histórias de terceiros, não quero saber de nada.
Só quero que saibas que me irei sempre recordar de ti como aquele rapaz que me protegeu da chuva, que me fez acreditar que valia a pena largar o passado, que por ele valia a pena tentar. Mesmo quando já não me lembrar bem de ti, do teu nome e de tudo, vou lembrar-me sempre daquele momento que mudou a minha vida. E é por isso que as memórias me estão a matar neste preciso momento.
Mesmo não estando na minha vida, fizeste-me evoluir, avançar, viver o presente e não uma ilusão do passado.
E não vou ser hipócrita ao ponto de dizer que espero que tudo corra bem com ela, porque não espero. Espero sim que arranjes alguém que te "descomplique", de alguém que te faça feliz, de alguém que te dê tudo o que mereces porque eu dei-te muito mais que isso, sem te dar e espero que aí já não tenha ciúmes dessa pessoa.
Sempre soubeste que escrever nunca foi o nosso remédio, mas foi sempre a nossa cura. E se há versos que nunca me esquecerei são estes, de Eugénio de Andrade "Já gastámos as palavras meu amor, e o que nos ficou não chega para afastar o frio de quatro paredes. (...) Não temos já nada para dar. Dentro de ti não há nada que me peça água. O passado é inútil como um trapo. E já te disse: as palavras estão gastas. Adeus."
Este poema resume tudo pelo o que passamos. Tenho muita pena de tudo se ter sucedido assim. Talvez se pudesse voltar atrás faria tudo de forma diferente. Mas tu ensinaste-me que não vale a pena olhar para trás, se o caminho é para a frente e a partir de agora assim o farei. Já não quero saber mais nada.
Vou ficar no meu quarto, vou fechar os olhos, ouvir música e sei que por vezes passarás pelos os meus pensamentos, talvez todas as manhãs e todas as noites, mas isso de certo passará, afinal como poderia uma pessoa significar tanto para mim, se por um passo em falso deixei de ter valor?!
Às vezes somos culpados por algo que não fizemos, dissemos nem pensámos, mas fico feliz pelo destino ter escolhido este caminho para mim, talvez sejas mais feliz assim, acreditando em todos aqueles que te querem mal.
Em tom de conclusão, quero só agradecer-te por tudo e principalmente por leres este meu desabafo, já não há mais a dizer. Já me magoaste o suficiente e fizeste-me ver que mesmo quando tudo parece o que é, afinal já não o é, deste-me o lado instável e estável da vida, num paradoxo deleitoso e infernal. Ensinaste-me que mesmo quando estamos a entregar-nos, a outra pessoa pode só estar a usar-nos e quando se cansar de nós, partirá para outra em menos de vinte e quatro horas, fingindo que nada se passou, foram só dias, uma página foi virada, um capítulo esquecido, algo substituível, peões de um jogo, sendo que o vencedor é sempre o mesmo jogador. Afinal a vida é feita de dias, os dias passam, os anos também e enquanto isso acontece, ficarei à espera de encontrar alguém que me valorize e que valorize também os sentimentos mútuos, me mereça, que seja tudo o que preciso e que me dê a confiança nunca antes obtida.

domingo, 10 de novembro de 2013

1-0

"Eu sei que você sente falta dele. Sei que você sente falta do jeito que ele te chamava, dos apelidos carinhosos destinados apenas a sua pessoa. Sei também que você sente falta das mãos dele, a propósito maiores que as suas, que insistiam em segurá-las em lugares públicos para dar a ideia de que “Ele é meu”. Sei que você sente falta dos casacos dele que te protegiam do frio, já que eram maiores que seu corpo. Sei que sente falta do cheiro dele também, e que já se pegou sentindo aquele perfume do nada, parece coisa de cinema, mas você já sentiu, admita. Sei que você sente falta da maneira como ele notava que estava mal, e da maneira que se importava até quando você dizia estar tudo bem. Sei que sente falta até de suas discussões, que mesmo nas piores, eram encerradas com um beijo vindo de ambas as partes. Sei que sente falta de ouvir a música de vocês, e sente porque é incapaz de ouvir de novo por não se sentir preparada para lembrar dele. Mas querendo ou não, você lembra dele não é, pequena ? Você fica dispersa na sala de aula escrevendo o nome dele nas bordas das folhas dos seus cadernos, não é ? Eu sei que você pode viver sem ele, mas simplesmente não quer, não é? Você ainda o ama, pequena. Se não amasse, a voz, o jeito, o cheiro e o toque dele não passariam pela sua cabeça enquanto digo todas essas coisas, já que eu simplesmente não citei nome de ninguém.."

sexta-feira, 8 de novembro de 2013

You’re my downfall, you’re my muse, my worst distraction, my rhythm and blues


Estou inspirada hoje e processo o que advém do mecanismo involuntário mais frequente que me assombra: pensar em ti.
Não sei se reparaste - mas sabes bem eu reparo em tudo e se esse tudo, tudo tiver que ver contigo, ainda é mais visto e decorado ao pormenor- quanto tempo já passou desde de que fomos o que já não somos, se calhar não te lembras, pois tu nunca te lembras de nada, creio que somente eu fico a remoer nestes pensamentos...
Queria saber o porquê. Porque é que tudo mudou? Porque é que já não falamos? Porque é que nos ignoramos? Fingimos que nem nos conhecemos? Vivemos vidas em paralelo que já foram intersetadas, fazemos de conta que tudo o que foi na verdade nunca o fora. Se há coisa em que eu fico a matutar é em ti, em tudo pelo o que passamos, nas nossas conversas ("our little talks"), nas músicas que não se cansam de sintonizar cada batida sua ao meu ritmo interior, no que dissemos, em todo o mal que fizemos, em todo o detrimento culminado destes atos mal pensados.
Sinto a tua falta, será que ainda não viste isso?! E o que me magoa, mais do que qualquer coisa que me tenhas feito ou dito, é o facto de ter a certeza que já nada em ti é saudade, já nada em ti sou eu, e, por incrível que pareça, já nada teu é teu.
Sei que estás bem, nunca mudarei isso; sei perfeitamente o que sentes, o que pensas e o que exprimes. A questão é que eu não sei o que fazer mais. Queres mesmo que abandone a tua vida? Queres dissociar-te de mim e de toda a minha bagagem? Queres afastar-te?
Dá-me uma resposta, mesmo que eu não te pergunte nada diretamente, diz-me se é isso que queres e eu aceitarei a tua escolha, apesar de já teres gasto as palavras quando o assunto sou eu. Mas porque é que não podemos reverter esta situação?! Não te peço nada, nem amor, nem confiança, nem carinho, só preciso do teu abraço, saber que estás perto ou algures por perto e, sinceramente, queria que ficasses. Talvez seja só meu esse desejo e assim sendo, nunca poderás ficar. Mas fica, por favor. Ou volta, melhor dizendo.
Quero que saibas que até das mínimas ações eu sinto falta, sinto falta de ver o teu nome no visor do meu telemóvel, mas também, porque é que não te lembras de mim? Será isso a resposta a todas as perguntas? Aceitarei isso como um "até nunca"?!
Acho que a expressão "preciso de ti" é demasiado forte. Contudo, acho que criei uma certa dependência a tudo o que tínhamos, claro que nunca te obriguei a ficar, a falares comigo, a lutares portanto, não é agora que o farei.
Tenho pena que tudo isto tenha resultado neste nada. Tenho pena de não saber como agir, de nunca saber como fazer as coisas de forma direita, será que a culpa é minha? Eu fiz alguma coisa? Só eu é que errei?
Nunca saberei, mas queria só perguntar-te mais uma coisa, será que te lembras disto?
"In my mind, when he's not right there besides me, I go crazy cause here isn't here I wanna be." // "R U Mine? <3"

quinta-feira, 7 de novembro de 2013

24/3/1936 - 08/11/2012


Olá vô, já viste como o tempo passa rápido?! Passou um ano e eu tenho imensas saudades. Queria que soubesses que gosto imenso de ti e que agora entendo o porquê de tudo ter acontecido como aconteceu.
A verdade é que naquela semana eu fiz de tudo para te ir visitar, mas por alguma razão nunca me deixaram, não sei se foi o destino, para que conservasse a tua imagem tal e qual como ainda hoje a tenho, não sei o porquê de não ter conseguido despedir-me de ti e dizer-te tudo aquilo que queria que soubesses e que ouvisses. Contudo, tenho a certeza que agora o sabes, que me ouves, só não sei se estás orgulhoso de mim.
A mudança e tudo o que aconteceu foi um choque, mas agradeço a uma entidade superior pelos 16 anos que convivi contigo, agradeço ainda mais os últimos quatro ou cinco anos, pois as minhas memórias mais bonitas datam essa idade e foram partilhadas contigo: Os natais, o último verão, as vezes que me protegias por ficar em chamada ou a ver televisão até tarde, as vezes em que adormecias no sofá e eu te dava na cabeça ou por não teres tomado os comprimidos a horas ou por não estares na cama, as vezes em que te calçava, e todas as vezes que me chamavas "noca", pensando que era a Ana que tinha chegado e quando te apercebias que era eu, pedias-me sempre a famosa "palheirinha" para beberes a tua água, ou para te ajudar a levantar, para te cobrir; as vezes em que tu e a avó discutiam por causa do espaço na cama e do calor, que eram as discussões mais cómicas que alguma vez ouvi, as vezes que chamavas pela "Maria" e eu ia ter contigo porque não queria acordar a vó e tentava, do meu jeito desajeitado, ajudar-te... Foram inúmeras as peripécias que tenho contigo, tuas, minhas e nossas. E eu confesso que mesmo passado meio ano eu ainda estava à espera que voltasses, mesmo sabendo que era impossível, pois apesar de ter passado esse tempo todo, chorava que nem uma perdida porque não sabia o que fazer, não tinha rumo muito menos direção. E tu não podias voltar e eu prendia-te aqui, a este mundo que te cansou, que abandonaste, mas que acredito que foi o melhor que fizeste, o melhor para ti. A morte não foi uma escolha, mas a solução. A solução mais dolorosa, a cicatriz mais profunda, a melindrabilidade do assunto em si é palpável. No entanto vô, fez-me crescer, ganhei algo que sei que nunca tive. Se foi difícil?! Tu sabes, porque tenho a certeza que viste, foi difícil ver-te na sala de jantar no Natal e depois tomar a consciência que não estavas mesmo lá, sentir a tua presença na cabeceira da mesa, sentir que estavas comigo foi tão bom e ao mesmo tempo tão triste. Passar pelo o teu quarto e ninguém me chamar, deitar-me na tua cama e sentir que estavas lá, só que eu não te podia tocar, não te via... Sabes vô, esta foi das primeiras "provas de fogo" a que fui submetida, ainda virão mais, e só de pensar na ideia, dói-me o peito, a alma, o que sou desaparece...
Há um ano tu, corporeamente, deixaste de existir, e mesmo que parte de mim tenha ido contigo, tu tornaste-me mais forte, mais capaz de ver o que me rodeia, a realidade eu que estou inserida, o mundo... E quero agradecer-te tanto por tudo o que ainda fazes por mim, porque és a minha estrelinha, a pessoa que olha por mim, que cuida de mim. Desculpa ter desistido de tudo quando tudo se passou, ter vacilado quando todos esperavam o contrário, apesar de tudo, cheguei aqui, estou aqui.
Fazes e sempre farás parte de mim, do meu sangue, do meu DNA, e quero que saibas que não há uma dia em que não me lembre de ti, do Homem de respeito, e sim, homem com h grande, porque tu eras o patriarca da família Sequeira, o Neca Alfredo (a tua alcunha aqui na freguesia), o meu avô, a quem eu chamava de bô e a pessoa que tinha um respeito enorme e um carinho ainda maior.
Sabes que a resposta à pergunta: "Gostas mais de mim ou do avô Santos?" continua a ser a mesma, porque foram ambos importantes para mim, tu não acompanhaste tanto o meu crescimento, mas sei que gostavas de mim desse teu jeito. Sabes que a "mais pequena" continua a ser forte, e se pudesse faria tudo de novo por ti, daria tudo para te ter aqui, para te poder abraçar e dar um beijinho na testa, como de costume - ainda te lembras do último beijinho na testa que te dei?! É incrível que ainda hoje me vêem as lágrimas aos olhos só de pensar naquele momento, quanto pousei os meus lábios na tua testa gélida, muito mais pálida que o habitual e reparei que não havia qualquer reação da tua parte, aquilo não era um pesadelo, era real e sabia que tinha que aceitar, mais tarde ou mais cedo. (Já na cerimónia, o que me custou mais foi ver o enterro, o desejo incontrolável de te tirar dali, de me levar para casa até acordares, um desejo inútil e inocente, mas eu não queria abdicar de ti.)
Por fim, eu sei que falo muito, mas acho que nem disse metade do que gostaria de dizer, quero que saibas que estamos bem, que continuamos a precisar de acreditar que estás aí e que nos guias, que gostamos muito, mas mesmo MUITO de ti, não é para ficar bonito, mas a verdade é que temos saudades e sentimos mesmo isto tudo. Éramos um todo, e sem ti algumas coisas já não fazem sentido, mas continuaremos a lutar por um lugar neste mundo, por aquilo que tu queríamos que fossemos, continuaremos a honrar-te. Só te peço que nunca me abandones, que continues aí mesmo que eu não precise, é que o reconforto de saber que depois da tempestade, de tudo o que se passou, eu consegui chegar onde estou, só se deve a ti. Eras e és um grande homem, um dos quatro homens da minha vida, sendo que o Scooby não pode estar integrado nesta categoria... Agora a sério, espero que me vejas, que estejas orgulhoso, que ouças aquilo que te digo quando te vou visitar, que sintas os beijinhos que dou a cada um das rosas branco pérola que te deixo, que me ilumines sempre e, o mais importante, que estejas bem, realizado, feliz pela geração que conduziu o teu legado ser o que é, apesar das complicações habituais.
Em suma, nunca te esqueças de mim, de nós todos, do que passamos, da vida que viveste e de tudo o que conseguiste somente com o teu esforço, lembra-te do meu papá que ainda se emociona e ainda te chama 'paizinho', lembra-te da sensação boa que crias em nós, mesmo que, infelizmente, não a possas sentir, vive connosco, porque tu estás aqui, com cada um de nós. Lembra-te do quanto me ria contigo e com a avó, lembra-te do meu beijinho na tua testa, lembra-te de tudo até o dia em que te volte a ver, espero, claro, que não seja assim tão cedo, apesar das saudades que já me são intrínsecas e que por incrível que pareça, crescerão mais. Lembra-te da tua família, pois como nos ensinaste, esta está em primeiro e lembra-te que mesmo que nem tu o que tu tenhas feito em vida tenha sido o melhor, recordar-te-emos como um dos melhores homens que já conhecemos, dos mais íntegros e fieis. Que eu lembrar-me-ei de ti, todos os dias, falarei contigo todos os dias e sei que cuidarás de mim. 
A vida é difícil, injusta e para mim, levou-te cedo demais seu teimoso, e cada traço teu, cada vez que assoavas o nariz, o modo como coçavas os olhos, o modo como andavas, falavas, tudo o que é teu estará em mim, e parte de mim estará sempre, para todo o sempre, em ti.
Beijinho muito grande, as saudades são muitas e tenho mesmo pena que não estejas, corporeamente presente em momentos importantes que estarão para vir na minha vida, mas sei que verás tudo. Gosto imenso de ti e obrigada por tudo vô.